Austrália: legalizar a maconha pode economizar 1,7 bilhão de dólares por ano para os cofres públicos

Fotografia que mostra um top bud de cannabis (maconha) repleto de pistilos de cor clara, sob uma iluminação amarelada. Crédito: Own Work | Wikimedia Commons.

O atual modelo de proibição demonstra ser ineficaz, pois falha em controlar a oferta, deixa o mercado nas mãos do crime organizado e custa uma fortuna para os contribuintes, diz novo relatório

Enquanto o crime organizado desfruta de enormes lucros com o comércio de maconha, o uso da substância aumenta e milhões de cidadãos cumpridores da lei são criminalizados, especialmente alguns dos mais marginalizados e vulneráveis.

Isso é o que aponta o Penington Institute, uma entidade sem fins lucrativos que promove pesquisa em saúde pública e política de drogas, em seu novo relatório sobre as tendências, atitudes e abordagens relacionadas à cannabis na Austrália.

Com mais de 700 mil prisões relacionadas à maconha na Austrália desde 2010, sendo que mais de 90% das acusações foram por posse para uso pessoal, o documento revela que em 2016 foram gastos 1,7 bilhão de dólares australianos (R$ 6 bilhões) na aplicação da lei relacionada à cannabis.

Leia também: Território da Capital Australiana descriminaliza pequenas quantidades de drogas ilícitas

“Em comparação com outras drogas comuns, a cannabis tem um perfil de baixo dano com impactos negativos à saúde menores do que aqueles associados à nicotina e ao álcool. No contexto do uso medicinal, o potencial para efeitos colaterais graves, como dependência, é insignificante quando considerado ao lado dos analgésicos e pílulas para dormir que são rotineiramente prescritos em toda a Austrália”, disse John Ryan, CEO do Penington Institute, no prefácio do relatório.

Ele ainda destaca que, apesar da possibilidade de consequências negativas advindas do uso de cannabis, como o risco de dependência para algumas pessoas, “os danos demonstrados e os enormes encargos financeiros associados à abordagem simplista de proibição da Austrália são muito mais prejudiciais do que a própria substância”.

O atual modelo de proibição demonstra ser ineficaz e ineficiente, visto que falha em controlar a oferta, deixa o mercado nas mãos de criminosos e custa bilhões de dólares em fiscalização, disse o relatório, ao mesmo tempo em que expõe as pessoas aos danos da criminalização.

“A proibição também impediu a pesquisa sobre os benefícios potenciais da cannabis e distorceu a pesquisa sobre as consequências negativas de seu uso”, adverte o relatório, pedindo que o país priorize “uma conversa aberta e racional sobre a regulamentação, impacto e usos da cannabis em suas diversas formas”.

Leia mais: Comissão Global de Políticas sobre Drogas recomenda o fim do regime de proibição

Enquanto o governo australiano desperdiça os dólares dos contribuintes em um modelo de proibição, os pacientes necessitados muitas vezes não conseguem pagar pelo acesso à maconha para fins medicinais, disse Ryan.

A qualidade da cannabis cultivada na Austrália é padrão mundial, mas nossos agricultores são forçados a aguardar enquanto os produtores na América do Norte e em outros lugares aproveitam os mercados que poderiam ser deles, incluindo nosso mercado doméstico”, disse ele.

“Regulamentações onerosas e falta de investimento do governo estão impedindo a indústria australiana de aproveitar esta oportunidade significativa”, alertou.

A última pesquisa domiciliar sobre a estratégia nacional de drogas, realizada pelo Instituto Australiano de Saúde e Bem-Estar durante o ano de 2019, descobriu que pela primeira vez mais pessoas disseram que apoiavam a legalização da maconha do que se opunham — 41% contra 37%. Também foi a primeira vez que a proporção de australianos que apoiavam o uso regular de cannabis por adultos era maior do que a proporção que apoiava o tabagismo regular (19,6% contra 15,4%).

Leia mais: EUA: jovens adultos estão mais propensos a fumar maconha do que tabaco

Dito isso, um estudo da Iniciativa Lambert da Universidade de Sydney divulgado em julho mostrou que a maioria dos australianos entrevistados na última pesquisa Cannabis as Medicine Survey está adquirindo maconha para uso medicinal do mercado ilícito.

O estudo incluiu 1.600 pessoas que usavam cannabis medicinal entre setembro de 2020 e janeiro de 2021, e constatou que 37% dos entrevistados receberam uma prescrição legal para maconha — um aumento significativo em relação aos 2,5% dos entrevistados que relataram uso de cannabis prescrita na pesquisa de 2018.

Os pesquisadores identificaram vários benefícios no uso prescrito em relação o uso ilícito de maconha, incluindo “vias de administração mais seguras, maior certeza de acesso, composição conhecida de THC/CBD e melhor comunicação com os profissionais de saúde”.

“Esses benefícios sugerem que mais esforços são necessários para fazer a transição de pacientes de produtos ilícitos para produtos de cannabis regulamentados e de qualidade controlada”, escreveram os autores.

No mês passado, a Associação Brasileira das Indústrias de Cannabis (Abicann) emitiu uma carta pública ao presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva pedindo para considerar a regulamentação da maconha para uso adulto, medicinal e industrial em suas políticas públicas.

Em um documento de 19 páginas, a entidade explica como a regulação da cannabis pode proporcionar uma “revolução verde e social”, estimulando a economia e, ainda, “ampliando o apoio aos excluídos das pautas governamentais”.

A associação denuncia que o Brasil ocupa o terceiro lugar no ranking de países que mais prendem e punem com prisão, principalmente jovens negros, sendo que “um a cada três dos 910 mil presidiários estão encarcerados por porte de drogas”.

O documento também afirma que o aproveitamento econômico do cânhamo para uso agroindustrial pode estimular mais de R$ 155 bilhões por ano na economia nacional, e ainda contribuir para o cumprimento das metas de redução de emissão de gás carbono do Conferência de Paris, a recuperação de terras degradadas por atividades predatórias e a redução do desemprego.

Veja também:

Maconha para uso adulto: Colômbia se aproxima do fim da proibição

#PraTodosVerem: fotografia mostra um top bud repleto de pistilos suculentos de cor clara e envolto por vários folíolos serrilhados, sob uma iluminação amarelada. Crédito: Egien | Wikimedia Commons.

Deixe seu comentário
Assine a nossa newsletter e receba as melhores matérias diretamente no seu email!