T-break: já pensou em tirar férias da maconha?
Saiba tudo sobre a estratégia de diminuir a tolerância aos efeitos da erva através de uma pausa no uso
Se você está percebendo que o mesmo bem bolado não faz mais os efeitos que fazia há um tempo, ao invés de aumentar a dose, talvez seja hora de experimentar o tolerance break (t-break, para os íntimos), uma espécie de férias da maconha. A estratégia que, à primeira vista, pode parecer controversa, é mais do que uma forma de diminuir a resistência do seu corpo aos efeitos da maconha, é um convite à autonomia e à apropriação do seu comportamento de consumo.
Para dichavar essa história e ajudar quem escolhe viver a experiência do t-break, trocamos uma ideia com a psicóloga Mariana Maia, da Klínica Desproibicionista, um coletivo de profissionais unidos pela motivação de compor um espaço de cuidado e acolhimento, ancorado na redução de danos, para oferecer um serviço de psicoterapia autônomo e emancipatório.
A ciência por trás do t-break
Do ponto de vista fisiológico, assim como acontece com outras substâncias, nosso organismo responde à exposição contínua aos canabinoides – o que explica o fato de que, com o passar do tempo e a frequência de uso, as brisas ficam menos intensas do que nas primeiras experiências com a maconha.
“O uso contínuo faz com que os efeitos sejam menores”, resume Mariana. “Então, a pausa de tolerância é para dar um reset no sistema endocanabinoide, para que os receptores voltem a ficar disponíveis e, quando houver a retomada do uso, a resposta do corpo seja melhor”.
Agora, sob uma visão holística dos padrões de comportamento atrelados ao uso da maconha, o t-break é uma oportunidade de autoconhecimento, de reflexão, de criação de uma consciência sobre a relação que se estabelece com a erva, para o bem e para o mal – um processo que deve partir, sempre, da escolha, mediante as possibilidades situacionais.
“Uma coisa que defendemos na redução de danos é pensar o porquê de a gente usar o que usa, o quando, o como… há uma produção de autonomia do sujeito nessa relação, que perpassa todo o campo da saúde”, diz Mariana. “A ideia da pausa é cessar o consumo para o corpo entender, e a gente também, como funcionamos sem esse atravessamento atrelado à rotina”.
Da teoria à prática
Se, na prática, toda teoria é linda, o fato é que a pausa de tolerância pode ser, sim, desafiadora – mas também guarda boas recompensas a quem topa encarar o desafio.
Variações no humor, no apetite, no sono, além de náusea, dor de cabeça e calafrios são sintomas de abstinência que podem surgir durante o t-break – que, segundo a psicóloga, idealmente dura em torno de uma semana, para consumidores ocasionais, a três semanas, para quem faz uso contínuo e em altas quantidades.
“Como a resposta é fisiológica, a gente tem que pensar no que vai surgir dali. É a mesma lógica que a gente usa os medicamentos de uso contínuo – o período do desmame, como chamamos”, explica. “É possível que os sintomas da abstinência sejam intensos, e não tem como saber sem fazer. Mas, cessar aos poucos é fazer com que nosso organismo responda aos poucos a essa falta de disposição à substância. Parar de vez aumenta o desafio”.
Além da diminuição gradual do consumo antes da pausa, Mariana recomenda o fortalecimento de uma rede de suporte, que envolve amigos, família e apoio profissional (quando couberem) que sirvam de ajuda no período de abstenção. E, caso o t-break se coloque como um desafio inalcançável, pelo motivo que for, existem outros caminhos, como a simples diminuição do consumo, super alinhada à estratégia de redução de danos.
“A ideia é que, independentemente do uso, da frequência e do tempo que se tenha relação com a substância, a gente sempre pense no lugar que isso tem na nossa vida, os sentidos do uso: prático, relacional, financeiro…”, diz a psicóloga.
O reencontro
E, se para você esse papo todo de pausa de tolerância e abstenção parece não ter nada a ver com a buena onda da maconha, saiba que, no fim, todo esse processo é para, justamente, elevar o prazer na hora da sessão.
“Ao falar em uso de maconha, eu faço questão de pautar o prazer, porque o medicinal já tem muito espaço, mas por que não usar só por que é bom?”, questiona Mariana. “Mas, esse bom deve sempre ser pensado: ‘é bom por quê? Como eu posso melhorar?’. Às vezes, melhorar é dar uma pausa, como é a ideia do t-break”.
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