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Lula diz que lei de drogas já “proibiu o usuário de ser preso” e critica decisão do STF sobre maconha

Lula diz que lei de drogas já “proibiu o usuário de ser preso” e critica decisão do STF sobre maconha

Presidente afirmou que prerrogativa sobre a descriminalização deveria ser da ciência

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou, nessa quarta-feira (26), que concorda com o estabelecimento de uma diferenciação na lei entre usuários e traficantes de drogas, mas criticou o fato de o Supremo Tribunal Federal (STF) ter julgado o assunto.

Em julgamento concluído nessa quarta, o STF declarou inconstitucional a criminalização da pessoa que porta maconha para uso pessoal. A tese adotada pela Corte estabeleceu que o porte de até 40 gramas ou seis plantas fêmeas de cannabis é um ato ilícito administrativo, e não penal.

“Eu vou dar só palpite, porque eu não sou advogado e não sou deputado. Eu acho que é nobre que haja diferenciação entre o consumidor, o usuário e o traficante. É necessário que a gente tenha uma decisão sobre isso — não na Suprema Corte, pode ser no Congresso Nacional para que a gente possa regular”, disse Lula em entrevista ao UOL.

Lula observou que a atual Lei de Drogas (11.343/2006), sancionada durante sua gestão, “proibiu o usuário de ser preso”. A legislação, no entanto, não possui critérios objetivos para a distinção entre usuários e traficantes, o que acabou impulsionando o encarceramento no país, ao deixar a definição do que é porte para consumo e o que é tráfico a cargo da subjetividade de policiais e juízes.

A lei sancionada por Lula ainda estabelece que “o local e as condições em que se desenvolveu a ação, as circunstâncias sociais e pessoais, bem como a conduta e os antecedentes do agente” devem ser observados pelo juiz para determinar se a droga apreendia é para consumo pessoal ou tráfico, o que permitiu a seletividade penal e o superencarceramento da população negra e pobre, como um número crescente de estudos vem apontando.

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“Se um dia um ministro da Suprema Corte pedisse um conselho para mim, eu falaria ‘recuse essas propostas’. A Suprema Corte não tem que se meter em tudo. Ela precisa pegar as coisas mais sérias sobre tudo aquilo que diz respeito à Constituição e ela virar senhora da situação, mas não pode pegar qualquer coisa e ficar discutindo. Porque aí começa a criar uma rivalidade que não é boa nem para democracia, nem para Suprema Corte, nem para o Congresso Nacional: a rivalidade entre quem é que manda, é o Congresso ou é a Suprema Corte?”, afirmou Lula.

Questionado se no caso específico da maconha a prerrogativa deveria ser do Congresso, Lula afirmou que deveria “ser da ciência”. “Cadê a comunidade psiquiátrica nesse país que não se manifesta e não é ouvida? Eu disse para o Barroso, eu fui uma vez jantar com ele, eu falei: ‘Barroso, por que você não convoca uma reunião de psiquiatras, de médicos, para discutir esse assunto?’. Não é uma coisa de código penal, é uma coisa de saúde pública. O mundo inteiro está utilizando o derivado da maconha para fazer remédio, tem gente que toma para dormir, para combater o Parkinson, para combater Alzheimer, ou seja, tem gente que toma para tudo. Eu tenho uma neta que tem convulsão, ela toma”, comentou o presidente.

Contudo, o usuário de maconha era considerado um criminoso sob a Lei 11.343, mesmo que penalizado com penas alternativas à prisão, o que é apontado no Recurso Extraordinário que foi julgado no Supremo. A ação, apresentada contra uma decisão judicial que manteve a condenação de um homem flagrado com 3 gramas de cannabis à pena de prestação de serviços à comunidade, denuncia a inconstitucionalidade do artigo 28 da legislação, por violar as garantias da inviolabilidade da vida privada e da intimidade.

O porte de maconha para consumo pessoal só deixou de ser crime após a decisão do STF, segundo a qual não comete infração penal quem adquirir, guardar ou portar até 40 gramas de cannabis ou seis plantas-fêmeas para uso próprio.

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Lula também questionou o motivo de ainda existir a “discussão contra ou a favor” sobre o uso da maconha, uma vez que “a ciência já está provando em vários lugares do mundo que é possível” sua aplicação medicinal. “Por que não encontra uma coisa saudável, referendada pelos médicos que entendem disso, pela psiquiatria brasileira ou mundial, pela Organização Mundial da Saúde, alguma referência mais nova para dizer ‘é isso’ e a gente obedece? Por que fica essa disputa de vaidade de quem é o pai de quem? Quem é a tese de quem? Isso não ajuda o Brasil”, indagou.

O presidente demonstrou desconhecimento sobre o que foi julgado no Supremo, alegando que a corte não deveria discutir o tema por já existir uma legislação “que garante que o usuário não é preso”, se referindo à lei 11.343. Um dos pontos centrais da discussão no julgamento foi justamente o fato de não existir na legislação um parâmetro objetivo para diferenciar o porte de drogas para consumo do tráfico, permitindo a prisão arbitrária de usuários.

“A decisão da Suprema Corte, se ela tiver uma PEC no Congresso Nacional, a PEC tende a ser pior”, ressaltou Lula, se referindo à proposta de emenda constitucional que busca criminalizar o usuário de drogas e tramita na Câmara dos Deputados.

Apresentada em setembro do ano passado como uma resposta política ao julgamento no STF, a PEC das Drogas busca alterar a Constituição Federal para incluir um dispositivo que criminaliza o porte e a posse de qualquer quantidade de droga ilícita. O texto foi elaborado pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e assinado por outros 30 senadores.

O resultado do julgamento foi criticado por Pacheco, que voltou a acusar a Suprema Corte de invadir a competência legislativa do Congresso Nacional. Segundo o senador, a descriminalização somente do porte de maconha para consumo, enquanto o comércio continua ilegal, “acaba gerando uma perplexidade inclusive no combate ao tráfico ilícito de entorpecentes”.

No mesmo dia em que o STF formou maioria pela inconstitucionalidade da criminalização do porte de maconha, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), publicou o ato de criação da comissão especial que analisará o mérito da PEC sobre drogas — se aprovada no colegiado, a proposta segue para votação no plenário, última etapa de sua tramitação.

Leia mais: Julgamento sobre maconha no STF gera reação no Congresso

Imagem de capa: UOL.

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