Parte de uma folha de cannabis em fundo branco. oto: 2H Media | Unsplash

Cannabis traz qualidade de vida a pessoas com doenças neurodegenerativas

Saiba mais sobre o potencial terapêutico da cannabis no tratamento de doenças neurodegenerativas crônicas

Os primeiros sinais são sutis. Um garfo cai da sua mão. Seus dedos ficam rígidos e sem resposta. Você tropeça com mais facilidade e a força que antes você considerava garantida começa a evaporar. Você começa a esquecer pequenos detalhes: nomes, rostos, palavras. Sua rotina se torna estranha, e sua casa e família parecem estranhas para você. São sinais precoces de Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA), Parkinson ou Alzheimer, doenças neurodegenerativas crônicas que afetam progressivamente as funções motoras e cognitivas, alterando profundamente a qualidade de vida.

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Esses diagnósticos vêm como um balde de água fria, fazendo com que todo o resto – dívidas, disputas e até mesmo o futebol – perca relevância. O que antes parecia importante desaparece, e acordar consciente e articuladamente pela manhã se torna um triunfo.

Paloma Sneh, psicóloga com experiência em cannabis medicinal, trabalha diariamente com pessoas que enfrentam esses desafios, ajudando-as a encontrar significado e alívio em meio à adversidade.

Em entrevista exclusiva ao El Planteo, Sneh compartilhou sua perspectiva sobre o potencial terapêutico da cannabis no tratamento de doenças neurodegenerativas: o alívio da dor crônica, a melhora do sono, o fim dos tremores e náuseas e a promoção da autonomia, destacando a importância de participação familiar e educação sobre o uso da planta.

Finitude e autonomia

“A cannabis atua como um modulador do sistema endocanabinoide, ajudando a restaurar o equilíbrio nas funções do corpo”, explica Sneh, acrescentando que o consumo supervisionado da planta pode aliviar dores crônicas, melhorar o sono e atenuar sintomas associados a doenças neurodegenerativas.

“Mesmo pequenas melhorias, como melhor sono ou menos dor, podem fazer uma grande diferença para adultos mais velhos e pacientes com doenças neurodegenerativas”, disse Sneh.

Para atender a essas necessidades, Sneh usa uma variedade de preparações de cannabis, incluindo óleos, comestíveis e cremes tópicos, adaptando os tratamentos às condições únicas de cada paciente.

“Para dores crônicas, vi como aplicações tópicas, como cremes à base de CBD, oferecem imenso alívio, especialmente para artrite e neuropatias”, diz.

Além disso, destaca a importância da dosagem cuidadosa, começando com doses mínimas e ajustando progressivamente de acordo com a resposta de cada paciente. Sneh ressalta que muitas vezes é apenas uma questão de controlar os sintomas que os pacientes estão apresentando, o que leva a uma dependência excessiva de medicamentos farmacêuticos.

Em vez disso, ela defende uma abordagem mais personalizada para cada paciente, levando em consideração sua qualidade de vida, rotinas diárias e as maneiras específicas pelas quais os tratamentos podem ser adaptados às suas necessidades. E embora alguns busquem especificamente a cannabis como tratamento para sintomas específicos, a motivação principal geralmente é simplesmente se sentir melhor na vida diária.

Cannabis, ELA, Parkinson e Alzheimer: uma questão de qualidade de vida

Quanto às doenças neurodegenerativas, Sneh ressalta que condições como o Alzheimer são mais comuns em adultos mais velhos, mas doenças como a ELA (esclerose lateral amiotrófica) podem afetar pessoas de qualquer idade, com maior prevalência em homens.

A ELA ataca os neurônios motores no cérebro e na medula espinhal, causando fraqueza muscular e paralisia, pois os neurônios responsáveis ​​pelo controle dos movimentos voluntários morrem progressivamente, deixando o corpo incapaz de funcionar.

A cannabis pode aliviar os sintomas da ELA, como dor crônica, espasticidade e dificuldade para dormir, melhorando a qualidade de vida e promovendo a autonomia, embora limitada pela degeneração da doença. Além disso, seus efeitos relaxantes e de melhora do humor proporcionam alívio emocional, ajudando a reduzir a ansiedade, a depressão e o medo associados à progressão da doença.

O Parkinson, outra doença neurodegenerativa, destrói os neurônios produtores de dopamina no cérebro, causando tremores incontroláveis, rigidez e dificuldade de movimentação e manutenção do equilíbrio, pois o cérebro perde a capacidade de coordenar as ações musculares. Em estágios avançados, pode afetar funções essenciais como a deglutição e, em casos graves, a respiração.

Em pacientes de Parkinson tratados com cannabis, Sneh observou melhorias significativas: alívio na rigidez muscular e recuperação da capacidade de engolir alimentos.

“A doença de Parkinson afeta os músculos e a cannabis os solta, reduzindo a quantidade de estímulos de tremor. Algumas pessoas acham difícil comer. O Parkinson faz com que a glote se contraia e eles não conseguem engolir. Com a cannabis, você pode relaxar um pouco a glote, e eles podem comer, mesmo que seja purê”, acrescenta Sneh.

Da mesma forma, adultos mais velhos podem experimentar uma melhora aparentemente pequena, mas significativa: a capacidade de voltar a dormir depois de acordar para ir ao banheiro à noite, o que transforma sua qualidade de vida.

“Há uma maior conscientização sobre a mortalidade em adultos mais velhos, mas isso torna ainda mais crucial trabalhar em direção a um senso de propósito e dignidade”, explica Sneh.

Viver com dignidade

Sneh também enfatiza a necessidade de abordar o envelhecimento com dignidade e propósito, especialmente no contexto de condições neurodegenerativas como o Alzheimer, que destrói lentamente as células cerebrais e suas conexões, levando à perda de memória e cognição à medida que o tecido cerebral se degenera.

“No caso dos pacientes de Alzheimer, há pequenos momentos de conscientização em que eles percebem que não podem ficar sozinhos ou que não podem cuidar de si mesmos ou que não podem sair na rua porque se perdem”, explica Sneh, acrescentando que sua abordagem terapêutica inclui não apenas alívio físico, mas também apoio no processo emocional de enfrentamento da mortalidade.

“Pessoas com corpos paralisados ​​podem mostrar progresso por meio do tratamento com cannabis. Eles podem redirecionar o olhar. Embora eles não se levantem e não façam mais as coisas que costumavam fazer, eles recuperarão alguma autonomia. É um tratamento que trata os sintomas. Não há como parar a degeneração celular, mas ela pode ser amenizada e tratada no dia a dia e trabalhando muito o ambiente familiar”, explica a psicóloga.

Vamos conversar sobre isso em casa?

O envolvimento da família geralmente é fundamental nos tratamentos com cannabis e Sneh destaca a importância de educar as famílias sobre o potencial terapêutico da planta. “Às vezes, as famílias não querem contar aos idosos que estão sendo tratados com cannabis”, alerta Sneh.

Ao lidar com as famílias dos pacientes, Sneh garante que eles entendam do que se trata esse medicamento exclusivo, como os canabinoides (compostos ativos) funcionam quimicamente no corpo e o que eles podem e não podem esperar.

“Sempre deixo claro que o melhor é contar ao paciente o que é; se ele recusar o tratamento, não tem problema. Deixe que eles conversem sobre isso com o médico e poderemos ter uma consulta. Em geral, os pacientes vêm até nós porque tentaram de tudo e nada funcionou. “Então eu digo: ‘Vamos experimentar a cannabis’”, diz Sneh.

“Não é um medicamento. Não gosto de falar em tratamento alternativo porque está provado que é um tratamento médico científico que tem efeitos colaterais, como todos os tratamentos, tem interações e deve ser administrado com certos cuidados e algumas contraindicações.”

Em alguns casos, a cannabis não pode ser administrada e em nenhum caso funciona da mesma forma. “Óleo oral, óleo comestível, óleo vaporizado ou aplicação tópica são todos diferentes”, diz Sneh.

Uma cultura terapêutica

Além de suas propriedades medicinais, a cannabis demonstrou benefícios inesperados na promoção da cura emocional e comunitária.

“Alguns pacientes também encontram propósito no cultivo de suas próprias plantas, em uma associação civil, ou em família, sob a proteção da Lei da Cannabis Medicinal 27.350, que acrescenta uma dimensão terapêutica ao tratamento”, revela Sneh. Ela conclui: “Esta atividade não só apoia a saúde física, mas também melhora o bem-estar emocional ao promover uma sensação de realização.”

Por Nicolás José Rodriguez, originalmente publicado no El Planteo.

Foto de capa: 2H Media | Unsplash

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