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Foto mostra as mãos de uma pessoa que usa luvas brancas enquanto segura um conta-gotas e um frasco contendo óleo, e um ramo de cannabis. Imagem: Freepik | nearxiii.

Extrato de maconha rico em CBD é seguro e eficaz para tratar sintomas do autismo em crianças e adolescentes, segundo estudo

A maioria dos pacientes demonstrou melhoras após o tratamento com óleo de cannabis, principalmente em relação à comunicação e à realização de atividades da vida diária

O tratamento com extrato de maconha dominante em canabidiol (CBD) pode aliviar os sintomas do Transtorno do Espectro Autista (TEA) e aumentar a qualidade de vida geral dos pacientes e de seus familiares, segundo um estudo publicado recentemente no periódico científico Pharmaceuticals.

Caracterizado por déficits de interação social, comunicação e comportamento, bem como pela presença de interesses ou atividades repetitivas, o TEA interfere na autonomia e no desenvolvimento social do paciente, o que pode afetar até mesmo a vida cotidiana de familiares e cuidadores. Embora tenham ocorrido avanços recentes, as opções de tratamento para os sintomas neuropsiquiátricos do autismo ainda são restritas, e as alternativas farmacológicas disponíveis não são específicas para os principais sintomas da condição.

Além disso, os tratamentos convencionais utilizados para o manejo comportamental e tratamento de pessoas com TEA não demonstraram benefícios significativos em relação à interação social, comunicação, função motora e desenvolvimento intelectual. Alguns medicamentos aprovados para a condição, como os antipsicóticos, ainda podem causar efeitos colaterais importantes, incluindo alterações cardíacas e desregulações metabólicas.

No entanto, estudos pré-clínicos e clínicos anteriores indicaram que o tratamento com cannabis demonstrou ser promissor na melhora de vários sintomas principais e comórbidos do autismo, com efeitos colaterais leves e pouco frequentes em comparação aos tratamentos convencionais.

Isso pode ser explicado por estudos que indicam que a expressão de endocanabinoides (canabinoides produzidos pelo próprio corpo) é alterada em indivíduos com TEA. Além disso, uma correlação entre o sistema endocanabinoide e o fenótipo autista já foi descrita devido ao envolvimento de canabinoides endógenos no controle de respostas emocionais e comportamentais. Um outro estudo observou ainda que a concentração plasmática de um dos principais endocanabinoides, a anandamida, é reduzida em crianças no espectro autista.

Sob esse pano de fundo, pesquisadores da Universidade de Brasília realizaram um estudo de coorte retrospectivo, observacional e transversal no qual avaliaram os efeitos terapêuticos de um extrato de cannabis rico em CBD no tratamento de crianças e adolescentes no espectro do autismo.

Para o estudo, 30 voluntários, com idades entre 5 e 18 anos e diagnosticados com TEA moderado a grave, foram recrutados no Hospital Universitário de Brasília (HUB). Todos os participantes eram pacientes do hospital e já haviam recebido pelo menos um tipo de tratamento medicamentoso anteriormente, como antipsicóticos, melatonina, anticonvulsivantes ou antidepressivos.

Os pacientes receberam uma dose diária de extrato de maconha de espectro completo (contendo 33 mg/ml de CBD para cada 1 mg/ml de THC) por 6 meses. A dose inicial para todos os participantes foi de 1 mg/kg/dia de CBD (0,03 mg/kg/dia de THC), a partir da qual foi adotado um regime progressivo, de acordo com as respostas de cada paciente.

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A evolução da interação social, comunicação e comportamento dos pacientes foi acompanhada por um neurologista através de questionários preenchidos antes e após 1, 3 e 6 meses de tratamento. Também foram realizadas entrevistas com a mãe, pai ou cuidador de cada participante ao final do período de acompanhamento, para avaliar a impressão das pessoas que passaram mais tempo com o paciente em relação aos seus sintomas autistas.

Os resultados mostraram melhorias na linguagem expressiva, realização de atividades da vida diária, comunicação, aprendizagem, afetividade, contato visual e atenção, bem como na agressividade, irritabilidade, agitação e problemas de sono.

Os aspectos sintomáticos com maior porcentagem de melhoria relatada pelos pais foram comunicação e interação pessoal, dificuldades cognitivas e déficit de atenção e hiperatividade, com melhora de 67%, 60% e 50%, respectivamente.

Algum nível de melhora na qualidade de vida do paciente e na qualidade de vida da família, bem como nos estados de humor positivos, foi relatado por pelo menos 80% das mães/pais.

Ocorreram efeitos colaterais do tratamento em alguns dos participantes, como irritabilidade, agitação, agressividade, dor de estômago, náusea, vômito, sonolência diurna, insônia, intensificação da compulsão alimentar e intensificação do transtorno obsessivo-compulsivo. A maioria desses efeitos, no entanto, foi resolvida por meio de uma redução na dose.

Mais de 70% dos participantes tiveram redução da dosagem e/ou suspensão de pelo menos um dos medicamentos adicionais que estavam tomando no início do tratamento com cannabis.

“Tanto a análise por categoria quanto por paciente em nossa coorte demonstraram que o tratamento com extrato de canabidiol de espectro total foi capaz de gerar melhorias globais significativas em todos os aspectos sintomáticos e não sintomáticos analisados com poucos efeitos adversos”, escreveram os pesquisadores.

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Os autores ressaltaram que o fato de os dados obtidos da família serem consistentes com os dados coletados na análise clínica indica que “os benefícios do tratamento extrapolaram o escopo clínico e médico e foram traduzidos e percebidos pelos pais e cuidadores, que acompanharam de perto o dia a dia dos indivíduos em tratamento”.

“Os achados corroboram que esse tratamento [com óleo de cannabis], combinado com um regime de dosagem gradual e individualizado, é seguro e eficaz para o tratamento mais amplo de sintomas centrais e comórbidos associados ao TEA, sendo capaz de melhorar aspectos como interação social, comunicação e qualidade de vida”, concluíram os autores.

No entanto, a equipe também apontou para algumas limitações do estudo, como o tamanho reduzido da amostra de participantes e a ausência de um grupo controle, o que pode gerar possíveis efeitos placebo (as percepções de melhora podem não estar diretamente relacionadas ao tratamento). Além disso, as categorias não sintomáticas foram avaliadas com base em aspectos mais subjetivos da vida do paciente e de seus familiares, bem como em outros aspectos comportamentais mais sutis que podem depender da sensibilidade de quem os observa.

O estudo foi realizado pelos pesquisadores Alice de Faria Martins Vieira, Doris Day Lopes Beserra, Fabio Viegas Caixeta, Jeanne Alves de Souza Mazza, Lisiane Seguti Ferreira, Renato Malcher Lopes e Victor Alves Rodrigues.

Em um estudo separado, pesquisadores afiliados à Universidade Federal da Paraíba realizaram um ensaio clínico duplo-cego e controlado por placebo para avaliar a eficácia e a segurança de um extrato de cannabis rico em canabidiol em crianças com TEA. Os resultados demonstraram que o tratamento apresentou melhora significativa na interação social, ansiedade e agitação psicomotora — apenas três das 31 crianças que receberam o extrato relataram efeitos colaterais muito leves.

“Portanto, observa-se que o extrato de cannabis rico em CBD é eficaz e pode ser usado com segurança, pelo menos em curto prazo, para aliviar alguns sintomas importantes relacionados ao TEA em crianças”, escreveram os autores do estudo paraibano, em um artigo publicado recentemente na revista Trends in Psychiatry and Psychotherapy, a publicação da Associação de Psiquiatria do Rio Grande do Sul.

Um outro estudo, publicado em 2019 na Frontiers in Neurology, já havia constatado a eficácia do óleo de maconha rico em canabidiol para a melhora dos sintomas do TEA. Os pesquisadores relataram que o tratamento com extrato de cannabis proporcionou melhorias evidentes no TDAH (transtorno de déficit de atenção e hiperatividade), distúrbios do sono e nos déficits de comunicação e interação social.

“Os achados apoiam a noção de que muitos sintomas de autismo estão associados à hiperexcitabilidade neuronal e indicam que o extrato de cannabis enriquecido com CBD produz efeitos positivos em múltiplos sintomas autistas, sem causar os efeitos colaterais típicos encontrados em pacientes com TEA medicados”, disseram os autores, ressaltando que a maioria dos pacientes no estudo apresentou melhorias mesmo após o desmame de outros medicamentos neuropsiquiátricos.

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Imagem de capa: Freepik | nearxiii.

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Joel Rodrigues

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