Desde a sua campanha para a vice-presidência, a democrata já demonstrava uma postura pró-cannabis promovendo legislações sobre o tema e expressando apoio à reforma
A vice-presidente dos Estados Unidos, Kamala Harris, vem quebrando barreiras desde que se tornou a primeira mulher negra a ser indicada por um grande partido para compor a chapa presidencial nas últimas eleições. Única a se qualificar para a indicação como candidata democrata na próxima eleição presidencial, Harris está próxima de se tornar a primeira mulher a comandar a Casa Branca.
Nesta segunda-feira (5), Harris se tornou a primeira mulher negra a ser escolhida por um grande partido político como candidata à presidência dos EUA. Ela já havia recebido o apoio do presidente Joe Biden, após este anunciar sua desistência da corrida eleitoral. Mas será que a candidata do Partido Democrata atenderá às reivindicações do movimento pela legalização da maconha caso seja eleita?
Levando em conta o posicionamento que Harris vem adotando nos últimos anos, tudo indica que seu mandato será favorável às pautas do movimento canábico. Após assumir cargos federais, a democrata vem demonstrando uma postura cada vez mais progressista em relação ao tema.
No início do ano, Harris pediu pela legalização da maconha e instou o Departamento de Justiça dos EUA a acelerar o processo de reclassificação da cannabis como uma substância menos perigosa, durante uma mesa redonda na Casa Branca com o rapper Fat Joe e várias pessoas que receberam indultos por condenações anteriores relacionadas à cannabis. O governo estadunidense iniciou o movimento de reconsiderar a classificação da maconha em outubro de 2022, quando Biden perdoou todas as pessoas condenadas por simples porte da planta.
“Esta questão é grave quando se considera o fato de que, na classificação atual, a maconha é considerada tão perigosa quanto a heroína. A maconha é considerada tão perigosa quanto a heroína e mais perigosa que o fentanil, o que é absurdo, para não dizer claramente injusto”, afirmou Harris durante a reunião, onde voltou a repetir o discurso de que “ninguém deveria ser preso por fumar maconha”.
Após pouco mais de um mês, Harris novamente pediu por mudanças na abordagem dos EUA em relação à cannabis em um post no X publicado às 16h20, no dia 20 de abril — data em que se celebra a maconha em todo o mundo. “Ninguém deveria ter que ir para a cadeia por fumar maconha”, reiterou a democrata.
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No final de abril, concordando com recomendação do Departamento de Saúde dos EUA para mover a cannabis do Anexo 1 para o Anexo 3 da lei de substâncias controladas, o Departamento de Justiça enviou uma proposta de reclassificação à Casa Branca, reconhecendo os usos médicos da maconha e que a planta tem menos potencial de abuso do que drogas como a heroína.
A proposta, que ainda sendo analisada pela Casa Branca e passou por um período de consulta pública, eliminaria o último obstáculo regulatório para a maior mudança política em relação à maconha dos EUA em mais de 50 anos, desde que a cannabis foi listada como uma substância estritamente proibida no país. Embora não legalize totalmente a planta, a mudança teria implicações importantes para a indústria da maconha e a pesquisa científica.
Durante uma entrevista a Jimmy Kimmel, exibida em junho, Harris voltou a defender que as pessoas não deveriam ser presas por fumar maconha e rebateu o mito da “droga de entrada”.
“Houve um tempo em que as pessoas diziam ‘bem, a maconha é uma droga de entrada’, e essas eram políticas fracassadas. Os recursos devem ser melhor direcionados — e serão melhor direcionados — para lidar com o vício em opioides e o que precisamos fazer em torno do fentanil, obtendo mais recursos para a saúde mental”, declarou a vice-presidente americana.
Como senadora dos EUA, Harris atuou em prol da legalização da cannabis promovendo esforços para facilitar a pesquisa sobre a planta e várias legislações sobre o tema, incluindo o Ato MORE, que visa descriminalizar a maconha em nível federal e usar fundos das vendas de maconha para investimento em comunidades afetadas pela guerra às drogas.
“Os tempos mudaram — a maconha não deveria ser um crime”, disse Harris em uma declaração quando anunciou o projeto de lei, em julho de 2019. “Precisamos começar a regular a maconha e expurgar as condenações por maconha dos registros de milhões de americanos para que eles possam seguir com suas vidas.”
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Em uma participação no programa de rádio “The Breakfast Club”, uma semana depois de anunciar sua candidatura presidencial em janeiro de 2019, Harris disse aos apresentadores que era a favor da legalização da maconha e que havia fumado um baseado na época da faculdade.
“Eu já. E eu inalei — eu inalei mesmo. Foi há muito tempo. Mas, sim”, respondeu a democrata, se referindo à famosa declaração do ex-presidente Bill Clinton “não inalei” que ele fez quando estava concorrendo à presidência em 1992.
No entanto, Harris nem sempre foi tão tolerante em relação à cannabis. Durante os anos em que foi promotora distrital de San Francisco e procuradora-geral da Califórnia, ela processou agressivamente crimes relacionados à maconha.
Entre 2004 e 2010, Harris atuou como promotora pública de San Francisco e, durante esse período, seu escritório condenou 1.956 pessoas por contravenção e crime por posse, cultivo ou venda de maconha. Segundo dados da promotoria revisados pelo The Mercury News, os números mostram que os promotores de Harris “parecem ter condenado pessoas por acusações de maconha a uma taxa mais alta do que sob seu antecessor, com base em dados sobre prisões por maconha na cidade”.
Como procuradora-geral da Califórnia, entre 2011 e 2016, Harris enviou pelo menos 2.000 pessoas às prisões estaduais por crimes relacionados à maconha, segundo dados divulgados pelo Departamento de Correções e Reabilitação do estado. Entretanto, relatórios do Departamento de Justiça da Califórnia revelam que 4.191 pessoas negras foram detidas nesse período por delitos relacionados à cannabis.
O posicionamento pró-reforma adotado por Harris pode ter surgido após a democrata perceber o erro que cometeu durante anos e enxergar na política uma oportunidade de reparação.
“O que precisamos fazer é reconhecer que muitas pessoas foram enviadas para a cadeia por simples posse de maconha”, disse Harris durante a mesa redonda. “E o impacto é tal que, em particular, os negros americanos e latinos têm quatro vezes mais probabilidade de serem presos por posse de maconha, e a disparidade é ainda maior quando você fala sobre o subconjunto de homens negros e latinos.”
Imagem de capa: reprodução / Facebook.