Erva dos deuses: conheça quatro divindades cannábicas

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Os enteógenos são utilizados como portais para acessar o divino e ajudar o homem na conexão com o mundo espiritual, e assim como a maconha, muitas dessas plantas chamadas de “ervas do diabo” são adoradas e cultivadas muito antes de sequer existir o cristianismo e o proibicionismo

Testes de carbono sugerem que a maconha e a humanidade caminham juntas há cerca de 10 mil anos!
Ela já foi utilizada de diferentes formas, seja para a utilização de suas fibras e sementes (cânhamo), como também por suas propriedades psicoativas e terapêuticas (THC e CBD). Até o século XIX, foi uma das plantas medicinais mais cultivadas em todo o mundo.

Culturas milenares utilizam plantas psicoativas em rituais de fé. Os enteógenos são utilizados como portais para acessar o divino e ajudar o homem na conexão com o mundo espiritual, e assim como a maconha, muitas dessas plantas chamadas de “ervas do diabo” são adoradas e cultivadas muito antes de sequer existir o cristianismo e o proibicionismo.

Você já deve ter ouvido falar que a ganja é uma planta sagrada para várias religiões.
Mas você sabia que existem divindades cannábicas?

Índia, Nepal, Paquistão: Os pesquisadores acreditam que é nessa região que se dá a origem da maconha, em muitos períodos da história, em lugares diferentes do mundo, a ganja aparece em vários escritos sagrados, onde é citada como um poderoso remédio para o corpo e a alma. No livro dos Vedas (hindu), ela é considerada uma das cinco plantas mais importantes que existem, mas também existem menções no Egito (kemet), China e África.

Aqui no Brasil, nós encontramos relações diretas entre a ganja e as matrizes culturais africanas e indígenas. Quer saber mais? Bola aquele que te faz bem e segue o fio:

Shiva

Esse deus hindu está associado à destruição e à regeneração do universo. O lorde canábico aparece fumando um em várias imagens tradicionais indianas, sua lenda conta que após uma grande briga com sua família, Shiva adormece em cima de uma plantação da verdinha e quando acorda sente vontade de experimentar suas folhas. Logo em seguida, ele é tomado por sentimentos de paz, alegria, prazer e disposição!
Aquela boa e velha chapada! Quem nunca?

Há centenas de anos, festivais como Maha Shivaratri e o Holi são realizados em seu nome em várias partes da índia e muitos quilos de sementes, folhas e flores de maconha são usados para fazer preparos religiosos.

O Bhang é uma bebida com receita milenar, que promete trazer bem-estar e efeitos de euforia física e mental a quem a prova!

 

Após a ingestão de bebida sagrada, um estado de êxtase é experimentado por danças e festejos musicais que podem durar vários dias, alguns outros preparos têm como base as sementes da maconha, um já conhecido superalimento, consideradas sagradas por terem ligação com Shiva.

Detalhe: A maconha é proibida na Índia e sua venda só é liberada apenas para fins religiosos.
Curiosidade: Gāñjā é o nome mais antigo associado à maconha e é muito comum na Índia e Jamaica.

Kali

Uma das faces da Grande Mãe para a cultura indiana, ela é responsável pela dualidade entre vida e morte e tem ligação com o elemento fogo. A parceira de Shiva é conhecida por vestir um colar de cabeças e ter a língua sempre pra fora escorrendo sangue. A visão pode ser um pouco pesada de início, mas ela representa muitas coisas: o oculto feminino, a lua negra, a morte do ego.

Seu nome significa tempo e a deusa da transformação também é associada à maconha em seus cultos, podendo ser usada na forma de incensos ou ingerida em alimentos como o Bhang, Goli (balinhas) e pratos típicos. Seus devotos consomem a maconha e se entregam a rituais de magia e sessões tântricas que levam ao orgasmo, em louvor de seu nome.

Exu

A liamba, fumo de Angola ou pito do pango, como era chamada a maconha pelos pretos escravizados, esteve presente em expressões religiosas de matriz africana no Brasil colônia, e acredita-se que as primeiras sementes chegaram aqui escondidas em navios negreiros, amarradas em roupas, tranças e bonecas de pano.

Registros históricos fazem a associação da planta com Oxalá — o pai de todos os orixás — e Exu, tendo sido registrado seu uso em casas e terreiros muito antes da criminalização. A principal relação da maconha é feita com o orixá Exu. Conhecido como deus do fogo e dos caminhos, mensageiro entre homens e deuses, essa divindade foi erroneamente interpretada e transformada em diabo, por conta do cristianismo imposto na época.

Essa fama associada a Exu ajudou ainda mais a propagar a ideia de que a maconha era algo ruim ou perigoso. O Brasil foi o primeiro país a proibir a “Erva do Diabo”, em 1830, exatamente por ter seu culto religioso associado à população marginalizada, composta principalmente por pessoas pretas, indígenas e trabalhadores.

Durante o uso do “Pito do pango” nos rituais de Djamba, os negros conectavam-se com sua espiritualidade através de danças, cantos e incorporações.

Entender que a proibição da maconha é fruto do racismo estrutural é de extrema urgência, pois somos o país que mais mata e encarcera no mundo. Hoje, a cada três pessoas presas, duas são negras! Quase metade dos crimes que levam à prisão estão relacionados à proibição de substâncias.

Santa Maria

Marijuana, Mary Jane e Santa Maria são nomes dados à mesma divindade ligada à figura de Maria, mas aqui no Brasil ela aparece como divindade em uma linha do Santo Daime, religião sincretista nascida na floresta amazônica que tem associação com a ayahuasca, fruto da intersecção cultural entre indígenas, caboclos e negros.

O Mestre Sebastião, responsável por introduzir a cannabis no Santo Daime, teve um sonho com a planta sagrada que fazia parte do seu caminho espiritual: a maconha. Ele percebeu que uma grande mentira estava sendo contada sobre ela e que isso era fruto de preconceito e precisava acabar! Em 1983, criou a comunidade do Céu do Mapiá, uma das áreas mais preservadas da floresta amazônica, e infelizmente eles já sofreram diversas perseguições e proibições ao longo dos anos, exatamente por adorar e cultivar a maconha de forma sagrada.

O Santo Daime seria a expressão do pai divino e a Santa Maria a grande mãe, os fiéis da linha de Sebastião dizem alcançar um grande estado de paz com seu uso, e para eles, ela chega em forma de “luz”, para afastar os maus espíritos e os sentimentos de agonia e medo, diminuindo dores e trazendo a sensação de proteção, conforto, amor e alegria.

Referências:

Revista Galileu

Hemp

Elástica

Sechat

Iphan

Leia também:

As Marias Proibidas

#PraTodosVerem: ilustração mostra uma divindade colorida em fundo verde composto por desenhos de folhas de cannabis e a frase “A erva dos deuses”. Crédito: Bem Bolado Brasil.

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