Associação Brasileira de Psiquiatria divulga informações distorcidas sobre o uso medicinal da maconha

Foto mostra um frasco âmbar de tampa preta e dourada junto a um bud e uma folha de cannabis, sobre uma superfície branca lisa. Imagem: our-team / Freepik.

Negando as evidências científicas atuais sobre o papel terapêutico da cannabis na psiquiatria, entidade emite posicionamento contra o uso da planta

A Associação Brasileira de Psiquiatria publicou recentemente um artigo onde expressa seu posicionamento retrógrado em relação ao uso da cannabis em tratamentos de doenças mentais.

O texto, que remete às propagandas antimaconha do início do século passado, começa dizendo que “não há evidências científicas suficientes que justifiquem o uso de nenhum dos derivados da cannabis no tratamento de doenças mentais” e que “diversos estudos” associam o uso da planta ao “desenvolvimento e agravamento de doenças mentais”.

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Assinada por dois diretores da ABP, a publicação também afirma que “o uso e abuso das substâncias psicoativas presentes na cannabis causam dependência química, podem desencadear quadros psiquiátricos e, ainda, piorar os sintomas de doenças mentais já diagnosticadas”.

Os veículos midiáticos que divulgam estudos científicos sobre os benefícios medicinais da maconha são criticados no artigo. Para a ABP, a difusão de informações sobre pesquisas de cannabis por esses meios corrobora para “interpretações equivocadas” e contribui para “a impressão de que a maconha é um produto totalmente seguro e inofensivo para o consumo, sobretudo pelos mais jovens”.

“A ABP, após avaliação criteriosa, tendo em vista os diversos prejuízos destacados, no momento, não apoia o uso da cannabis e de seus derivados com fins medicinais na área de Psiquiatria, nem apoia seu uso para fins recreativos”, diz a publicação.

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Em nota de esclarecimento, a Associação Pan-Americana de Medicina Canabinoide (APMC) diz que o documento da ABP trata-se de um artigo de opinião claramente enviesado por posições ideológicas e não científicas.

A nota, assinada por membros dos comitês de Psiquiatria e de Neurologia e do conselho consultivo da APMC, afirma que “os comitês científicos da APMC foram surpreendidos e alarmados por artigo intitulado ‘Position statement of the Brazilian Psychiatric Association on the use of cannabis in psychiatric treatment’ assinado por apenas dois autores. Trata-se de um artigo de opinião publicado no periódico ‘Brazilian Journal of Psychiatry’, claramente enviesado por posições ideológicas e não científicas, sem menção a trabalho dos comitês científicos da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) ou mesmo a uma simples consulta pública aos associados da ABP, de modo que parece refletir a posição de sua Diretoria e não representar um consenso da comunidade de psiquiatras a ela associados”.

“Em prol do bom debate, a APMC vem a público esclarecer as distorções e os aspectos errôneos apontados no artigo”, diz a nota, destacando que a revisão de Kirkland e colaboradores, utilizada como base para a afirmação de que as evidências científicas que amparam o uso clínico de canabinoides no tratamento dos transtornos mentais são insuficientes, “apresenta limitações e falhas metodológicas graves”.

Como, por exemplo, a exclusão de estudos que investigaram intervenções com combinações de CBD (canabidiol) e THC (tetraidrocanabinol), o que elimina as pesquisas com nabiximois para transtornos por uso de canabinoides e de extratos integrais no tratamento do autismo.

E a avaliação da eficácia do canabidiol como tratamento para transtornos psicóticos, onde os autores incluíram seis estudos, dos quais três teriam tido um resultado positivo e três seriam estudos com resultados negativos. “Isto levou à conclusão de que a evidência hoje seria ‘mista’. No entanto, dois dos três estudos negativos mencionados são na verdade publicações diferentes do mesmo estudo. O estudo referido com ‘negativo’ tratava-se de uma investigação ‘prova de conceito’ de neuroimagem que buscou avaliar os efeitos da administração de uma dose única de CBD 600 mg ou placebo em parâmetros de conectividade cerebral e níveis de glutamato hipocampal em 13 pacientes psicóticos. Ou seja, não se trata de um estudo clínico com o objetivo de avaliar a eficácia do CBD no tratamento de transtornos psicóticos e ainda assim foi ‘contado’ em duplicidade pelos autores”.

“Para piorar, o resultado deste estudo foi positivo: O’Neil e colaboradores, utilizando um desenho de estudo cruzado, observaram uma redução em sintomas psicóticos totais, 270 minutos após a administração de dose única de CBD 600 mg versus placebo”, explica a APMC, apontando as distorções cometidas pela ABP.

Os representantes da APMC comentam ponto a ponto as afirmações da Associação Brasileira de Psiquiatria, contestando todas inverdades difundidas pela entidade a respeito da cannabis. Clique aqui para acessar o documento na íntegra.

A propaganda anticannabis da ABP ocorre após o governo federal lançar uma cartilha que demoniza a maconha com informações distorcidas e falsas sobre o tema.

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#PraTodosVerem: foto mostra um frasco âmbar de tampa preta e dourada junto a um bud e uma folha de maconha, sobre uma superfície branca lisa. Imagem: our-team / Freepik.

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