MACONHA NA PROPAGANDA ELEITORAL

Segundo a PRE, Barros incita de forma explícita o consumo da maconha em um vídeo da campanha, mas para nós, para o STF e para o candidato a Vereador (50420) pelo PSOL Rio de Janeiro, qualquer tentativa de censura neste período eleitoral é um ataque gravíssimo ao Estado Democrático de Direito. Acesse e entenda mais sobre o assunto na coluna semanal do advogado e ativista André Barros.

Na última sexta-feira do dia 26 de agosto, a Procuradoria Regional Eleitoral pediu abertura de investigação contra minha candidatura por crime de apologia do uso de maconha. A motivação foi um vídeo da campanha onde falo “baseado na sua consciência, baseado na sua mente” e, ao final, “aperta de novo o verde”. Primeiramente, é interessante consignar que o Ministro Marco Aurélio de Mello, no julgamento da Marcha da Maconha no Supremo Tribunal Federal, em 15 de junho de 2011, votou da seguinte forma: “Não interpretem minhas palavras de forma jocosa, mas eu voto baseado no relator”.

Nesta decisão com efeito vinculante em razão do quorum qualificado de 9 x 0, na Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 187, o STF declarou que “nenhuma manifestação ou debate sobre a legalização da maconha poderiam ser interpretados como crime de apologia”. Mesma decisão foi adotada, também com efeito vinculante em razão da decisão por 8 x 0, na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4274.

Jamais afirmei em qualquer propaganda eleitoral que legalizaria a maconha na Câmara dos Vereadores, já que a mudança da lei penal é de competência privativa da União. Mas proibir o debate sobre a legalização da maconha e os vários aspectos de sua criminalização, como suas raízes racistas e classistas, é claramente um ataque à soberania popular, ao sufrágio universal, ao voto direto e secreto, com valor igual para todos, e o pleno exercício do direito político. A censura de tão atual debate ataca a própria dinâmica da sociedade em seus processos de mudança na esfera dos costumes, tradições e hábitos sociais, bem como viola as decisões do STF. Essas decisões declararam que o debate público da legalização da maconha não pode ser interpretado como crime de apologia às drogas, muito menos pode ser proibido num processo eleitoral, momento mais do que propício para um tema que tanto afeta nossa cidade. Quero denunciar que essa guerra às drogas é um fachada para justificar um sistema penal racista, que só reprime vendas a varejo nas comunidades do Rio de Janeiro, matando e prendendo jovens, negros e pobres. É público e notório que o comércio e o consumo de maconha ocorrem em toda a cidade, então, por que reprimir somente onde vive a maioria dos negros?

Mesmo sem poder mudar a lei sobre a maconha, o debate existe dentro da Câmara dos Vereadores, que tem, inclusive, uma Comissão Permanente de Prevenção às Drogas. Na Prefeitura, o debate também acontece no Conselho Municipal Antidrogas. A mudança de suas denominações, de cunho proibicionista, será uma das primeiras lutas. No primeiro ano em que o bloco “Planta na Mente” desfilou, em março de 2011, quando estávamos ainda concentrados na Escadaria do Selaron, chegou um ônibus da Guarda Municipal, acompanhado de aparato da Polícia Militar, onde um funcionário disse que havia recebido, do Presidente da referida comissão da Câmara dos Vereadores, uma ordem proibindo a saída do bloco. Após longa negociação, o “Planta” saiu. Trata-se de um exemplo concreto de que existe o debate da maconha na Câmara Municipal, mas sempre foi pautado pelo proibicionismo.

Fui um dos advogados que formulou e assinou os habeas corpus que garantiram as Marchas da Maconha em Ipanema, que elaborou ofícios para as Marchas da Maconha em Niterói, Nova Iguaçu, São Gonçalo, Petrópolis e Friburgo, bem como a representação ao STF que garantiu as Marchas da Maconha em todo o país. Sem falar nos casos de pessoas presas por maconha e plantadores acusados de tráfico de drogas. Sou um conhecido militante da causa e já estou inserido na luta pela legalização da maconha para fins recreativos, medicinais, religiosos e outras finalidades há muito tempo. Não estou fazendo promessas futuras, já que a referida propaganda eleitoral reflete a história de minha vida nessa e tantas outras lutas da cidade.

Toda a linguagem e performance da campanha são permeadas por metáforas, ironia e bom humor, afinadas com a cultura canábica, criada pelos maconheiros e maconheiras, engendrando uma espécie de dialeto, fruto da ilegalidade, da perseguição e da forte repressão. A forma é o conteúdo: o debate da maconha fala esta língua! Qualquer tentativa de impedir, neste período eleitoral, a criatividade da campanha, ferramenta da propaganda no sufrágio universal, é um ataque gravíssimo ao Estado Democrático de Direito.

Sobre André Barros

ANDRÉ BARROS é advogado da Marcha da Maconha, mestre em Ciências Penais, vice-presidente da Comissão de Direitos Sociais e Interlocução Sociopopular da Ordem dos Advogados do Brasil e membro do Instituto dos Advogados Brasileiros
Deixe seu comentário
Assine a nossa newsletter e receba as melhores matérias diretamente no seu email!